Sensacionalismo, paternalismo ou falta de conhecimento?
É verdade que parece estar a melhorar, já se ouvindo falar em taxas de crescimento, mas nos programas generalistas como noticiários, os números de casos (reportados, embora tal não seja sempre salientado) é, ainda, maioritariamente indicado em valores absolutos acompanhados com descrições como “o número mais alto desde o início da pandemia”. A informação disponibilizada relativamente a outros países como Espanha, Itália e mais recentemente EUA, é também ela referida em números absolutos sem qualquer ajuste à dimensão das populações em causa ou qualquer comparação relativa de taxas de crescimento. Mas foquemos por agora nos dados nacionais.
O encerrar das escolas, o distanciamento social, o dever de recolhimento, entre muitas outras medidas implementadas no contexto do Estado de Emergência exigem um enorme esforço de todos. É evidente que tal esforço é necessário, mas, por isso mesmo, seria útil dar a conhecer à população, na medida dos dados disponíveis, o resultado desse esforço. Tal abordagem tem subjacente o reforço positivo por oposição ao medo como motor de sucesso das medidas implementadas.
Somente com base em dados claramente apresentados e bem documentados, governos, organizações e indivíduos esperam responder adequadamente à pandemia do COVID-19. Numa pandemia é importante não apenas estudar o número absoluto de casos, mas também a respetiva taxa de crescimento. A razão é simples: mesmo um pequeno número de casos, pode tornar-se rapidamente elevado se a taxa de crescimento for “substancial”.
Uma forma intuitiva de olhar para a taxa de crescimento é ver quanto tempo demora a duplicar o número de casos. Se, durante um surto, o número de dias que leva para que os casos dupliquem permanecer constante, a doença está a crescer exponencialmente. Se as medidas implementadas estiverem a dar resultados, o número de dias que demora a duplicar o número total de casos vai aumentando – estamos a abrandar ou “achatar a curva”.
Ora, seria útil informar os portugueses do resultado do seu esforço. Como está Portugal a evoluir em termos de taxa de crescimento? O gráfico abaixo, parece indicar que, pelo menos em termos de casos reportados, os esforços dos portugueses estão a dar resultados. Celebremos sem baixar a guarda.
Fonte: European Centre for Disease Prevention and Control.
Se os esforços parecem estar a dar resultados, a pergunta seguinte é se serão suficientes ou demasiados (pouco provável, mas teoricamente possível). Nesse contexto interessaria conhecer a capacidade instalada e até que ponto esta pode ser alargada. Por exemplo, quantas camas em unidades de cuidados intensivos (ou quantos ventiladores ou outros indicadores relevantes) temos disponíveis quando contabilizada equipa de pessoal de saúde necessária ao seu funcionamento? A não disponibilização desta informação cria desconfiança e fomenta o pânico já que tendemos a assumir que se não dizem é porque não há suficiente. Mesmo que seja esse o caso, porquê o paternalismo? Não seria o conhecimento das dificuldades um bom motivador para evitar as férias de Páscoa na terra?
Filipa Aragão
Maple Health Group, LLC , e NOVA Escola Nacional de Saúde Pública, Centro de Investigação em Saúde Pública, Universidade NOVA de Lisboa, Portugal