A saúde é o que nos permite viver a vida em plenitude. O valor que tendemos a atribuir-lhe é tão elevado que há um ditado popular que diz “a saúde não tem preço”. Contudo, embora possamos dizer que individualmente a nossa saúde não tem preço, ou seja, não conseguimos atribuir um valor monetário à saúde que temos, a saúde de uma população tem um custo. E os custos em saúde tendem a ser bastante elevados.
Há dois problemas no SNS que ainda não se conseguiram ultrapassar desde a sua criação: 1) a equidade no acesso; 2) recursos financeiros adequados.
Se olharmos para a despesa em saúde em percentagem do produto interno bruto (PIB) constatamos que, na maioria dos países de elevado rendimento, são estas despesas as que representam o valor mais elevado a par das despesas da segurança social. Portugal não é aqui uma exceção. E o que se faz com todo este dinheiro?
Os recursos que afetamos ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) são o que permite termos ganhos em saúde para toda a população portuguesa e que se traduzem, por exemplo, na redução da mortalidade infantil e aumento da esperança média de vida à nascença e também fintar muitas doenças que nos vão afligindo ao longo da vida.
A COVID19 veio trazer uma disrupção na prestação de cuidados e, mais uma vez, aqueles que não tinham forma de procurar alternativas fora do SNS foram os mais afetados. Sabe-se que deixaram de ser feitas consultas, cirurgias e que muitos dos programas de rastreio de cancro foram praticamente suspensos. Esta paragem na prestação de cuidados contribuiu para aumentar as listas de espera em todas as áreas. Contudo, este não é um problema novo, é um problema com que o SNS se debate há muitos anos.
Como não há consultas regulares nos centros de saúde, não há envio de doentes para as consultas de especialidade, os doentes não estão a ser diagnosticados, não há cirurgias, não há tratamento. Os resultados que se estavam a obter no tratamento da diabetes, da hipertensão, das doenças cardiovasculares, do cancro, vão piorar de forma significativa. Estes doentes vão chegar aos cuidados de saúde em fases mais agudas da doença.
Que SNS vamos ter para os receber? Quando a pandemia acabar os profissionais de saúde estarão emocionalmente exaustos e em burnout. Além das sequelas emocionais, muitos também se vão debater com as sequelas físicas da COVID19.
Embora o SNS tenha cobertura nacional, a dotação dos equipamentos não é equitativa. Há uma maior concentração de unidades de saúde (hospitais e cuidados de saúde primários) no litoral do país, principalmente entre Lisboa e Viana do Castelo. Esta distribuição tem reflexos no acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde. Em muitas aldeias de Portugal, a farmácia é a ligação mais permanente aos cuidados de saúde. Populações envelhecidas, com baixos níveis de literacia, baixos rendimentos e sem meios de transporte ficam, muitas vezes, excluídas do acesso aos cuidados de saúde. É verdade que se tem progredido imenso, mas é preciso fazer ainda mais. A estas populações, muitas vezes, nem as teleconsultas chegam. Nas zonas urbanas, as dificuldades de acesso podem estar relacionadas com a inexistência de médico de família ou listas de espera para consultas, entre outras.
A sustentabilidade do financiamento do SNS continua a ser uma preocupação. As necessidades de recursos são crescentes e esse ritmo não é acompanhado pelo crescimento do PIB. Portugal é o país com um SNS onde as famílias têm maiores despesas com cuidados de saúde. Esta situação torna o acesso aos cuidados de saúde das famílias de baixos rendimentos ainda mais difícil. Os hospitais do SNS têm níveis de dívida muito elevados, antecipando-se que esta situação seja agravada pela atual pandemia. O desafio talvez resida em medidas que visem a redução do desperdício, com metas claras e monitorização regular, já que a injeção periódica de dinheiro não tem sido grande solução.
Não nos devemos igualmente esquecer dos desafios futuros que estão relacionados com o envelhecimento saudável da população e os problemas de saúde decorrentes das alterações climáticas, como vagas de frio ou de calor, por exemplo, e o impacto da poluição na saúde.
Céu Mateus, Presidente da APES
Universidade de Lancaster