Nos últimos tempos muito se tem falado das repercussões desta pandemia na saúde mental. E aqui entra a questão do desemprego. Ora vejamos.
No passado mês de junho, o Instituto Nacional de Estatística (INE) divulgou as suas estimativas da taxa de desemprego para os meses de março e abril. De acordo com esta entidade, a taxa de desemprego em março situou-se nos 6,2%, e em abril nos 6,3%. Uma análise à taxa de desemprego por grupo etário permite verificar que são os jovens, dos 15 aos 24 anos, que mais sofrem com o desemprego. Neste grupo etário, a taxa de desemprego atingiu os 18,3% em março e os 20,2% em abril (mais 3,1 pontos percentuais face ao mesmo mês do ano anterior). Estes valores estão perto dos registados na última crise financeira internacional em 2008. Segundo o INE, os dados recolhidos para o cálculo deste indicador podem não refletir a realidade devido ao atual contexto de pandemia, o que significa que as estimativas provisórias poderão sofrer alterações substanciais1.
Porque é que isto deve fazer soar o alarme? Porque sabemos que o desemprego está associado, entre outros fatores, à perda de rendimento, instabilidade financeira, estigma social, perda de autoestima e diminuição da atividade física e mental do indivíduo2. Todos estes factores têm um impacto negativo na saúde mental uma vez que contribuem para o aumento ou agravamento das doenças associadas à depressão e ansiedade. Sabe-se ainda que jovens desempregados têm maior probabilidade de desenvolver doença mental quando comparados com os jovens empregados3. Há também evidência que uma pior saúde mental se associa a um período de desemprego mais longo criando, assim, um ciclo vicioso2. Adicionalmente, há uma conjuntura económica e social inerente à atual pandemia que contribui para uma pior saúde mental. O isolamento social ou incerteza em relação ao futuro são disso exemplos.
Da última crise económica sabemos que Portugal registou um aumento importante da prevalência de sofrimento psicológico e que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) não foi capaz de dar resposta ao aumento das necessidades de cuidados de saúde mental4. Para evitar que voltemos a este cenário e a uma trajetória da taxa de desemprego (jovem) como a que se verificou nessa altura, o governo deve começar já a combater o desemprego promovendo a saúde mental. De facto, programas de empregabilidade que incorporam elementos de promoção da saúde mental mostram-se eficazes na redução das dificuldades económicas sentidas e na melhor capacidade para lidar com adversidades5. São exemplos de elementos promotores de saúde mental, o aumento da autoestima, maior controlo sobre si e o meio, melhores estratégias de coping e de autoconhecimento.
Para que tal seja atingível, é necessário que haja maior coordenação e simbiose entre os Ministérios da Saúde, Emprego e Segurança Social.
Maria Ana Matias
Centre for Health Economics, University of York
Referências:
1 INE (2020). Destaque: Informação à comunicação social. Estimativas Mensais de Emprego e Desemprego: Abril de 2020.
2 Organisation for Economic Co-operation and Development (2012). Sick on the job? Myths and Realities about Mental Health and Work. OECD Publishing.
3 World Health Organization (2011). Impact of economic crisis on mental health. WHO, Geneva.
4 Caldas de Almeida J. et al. (2017). Implicações do estudo da crise económica na saúde mental dos Portugueses. PsiLOGOS, 15(2), Editorial Convidado.
5 Reynolds C., Barry M. and Gabhainn S. (2010). Evaluating the Impact of the Winning New Jobs Programme on the Re-employment and Mental Health of a Mixed Profile of Unemployed People. International Journal of Mental Health Promotion, 12(2), 32-41.