A pandemia e a situação de confinamento excecional que vivemos recentemente apanhou-nos a todos desprevenidos. Em março passado, de um dia para o outro, o mundo parou: as escolas fecharam, os restaurantes, os hotéis e uma grande parte do comércio fechou, os lares e os hospitais proibiram visitas, as pessoas foram enviadas para casa em teletrabalho… isto aconteceu um pouco por todo o mundo. Vários países fecharam as suas fronteiras, repatriaram cidadãos e desencorajaram o turismo. Assistimos todos a algo nunca visto, em que os aviões que antes cruzavam os céus, ficaram parados pela suspensão das viagens aéreas entre continentes, dentro de continentes e mesmo dentro do próprio país. Nalguns países, a circulação ferroviária e terrestre também foi suspensa.
Apesar de várias medidas de prevenção tomadas, com o número de casos e mortes a aumentar, a situação rapidamente evoluiu de um isolamento social para medidas de confinamento domiciliário, com sérias consequências para a população e para as economias. De facto, a 3 de abril de 2020 aproximadamente 4 mil milhões de pessoas em todo o mundo encontravam-se em confinamento.
Em Portugal, a situação foi semelhante ao que se passou noutros países da Europa: a 18 de março foi decretado o estado de emergência e implementadas medidas de confinamento, e apenas no início de maio se iniciou o desconfinamento.
Esta inatividade física imposta durante várias semanas, o facto da maioria das famílias terem que partilhar um espaço muitas vezes pequeno para trabalhar, estudar, cozinhar, brincar e praticar exercício físico, aliada ao medo que poderiam sentir por elas ou pelos seus parentes e amigos e, muito provavelmente, exacerbada pela quantidade de informação fornecida pelos meios de comunicação social, pode ter deixado as pessoas em pânico, aumentado a ansiedade e a depressão, e diminuído a sua qualidade de vida.
Neste sentido, pareceu-nos importante conduzir um estudo de opinião durante o confinamento para percebermos qual o seu impacto na ansiedade e na qualidade de vida dos Portugueses. Os resultados principais do estudo estão resumidos nos infográficos seguintes.
Os resultados mostram que os respondentes que se encontravam em confinamento reportaram níveis elevados de ansiedade, uma menor qualidade de vida relacionada com a saúde (QVRS) e que pessoas com elevados níveis de ansiedade tenderam a ter menor QVRS. As mulheres e os idosos reportaram níveis mais altos de ansiedade e pior QVRS. Os níveis mais altos de ansiedade nos idosos podem ser explicados pelo fato de pertencerem ao grupo de risco da pandemia de COVID-19. Nas restantes faixas etárias os níveis de ansiedade podem ser devidos a vários fatores, como a incerteza do futuro, o facto de estarem a trabalhar em casa, a cuidar de crianças pequenas e a ajudar no trabalho escolar, muitas vezes em simultâneo, medo de que possam ser infetadas ou de que isso possa acontecer aos seus parentes e amigos. Este estudo destaca a necessidade de fornecer apoio adequado aos cuidados de saúde mental durante um surto de pandemia. Na verdade, os Governos devem, não apenas prestar atenção ao controlo da doença, mas também adotar medidas sociais e de saúde projetadas especificamente para a saúde mental e para lidar com sentimentos de solidão, prevenindo assim a diminuição da QVRS. Se uma segunda vaga efetivamente acontecer, como está a ser projetado por vários cientistas, e for necessário entrarmos em confinamento outra vez, como já aconteceu nalgumas regiões do mundo, será necessário planear e tomar decisões informadas com base nas lições aprendidas durante essa situação excecional.
De qualquer forma, o impacto do confinamento na qualidade de vida da população e na sua saúde mental é algo que continuará a merecer a nossa atenção, uma vez que os estragos e as cicatrizes desta situação totalmente nova e inesperada irão muito provavelmente estender-se durante algum tempo. A incerteza do futuro leva muita gente a questionar-se: será que vai ficar tudo bem?
Lara Noronha Ferreira
Universidade do Algarve, Escola Superior de Gestão, Hotelaria e Turismo
Centro de Estudos e Investigação em Saúde da Universidade de Coimbra