A eficiência dos sistemas de saúde e das instituições que os compõem sempre foi uma questão central para os economistas da saúde, mas assumiu uma maior relevância a partir das crises orçamentais que afetaram vários países (incluindo Portugal) no início da década passada. Simplificadamente, aumentar a eficiência dos sistemas de saúde implica maximizar os ganhos em saúde para um dado conjunto de recursos, ou minimizar a utilização de recursos necessários para obter um dado nível de saúde. Aumentar a eficiência dos sistemas de saúde seria assim a forma de compatibilizar a manutenção dos ganhos em saúde da população com a necessária contenção do crescimento da despesa pública com a saúde, imposta pelas severas restrições orçamentais que afetavam muitos países.
A pandemia da COVID-19 mudou o foco da eficiência para a resiliência dos sistemas de saúde. O conceito de resiliência do sistema de saúde é recente e ainda não está consolidado, mas é geralmente definido como a capacidade para responder eficazmente a crises, sem comprometer as funções centrais do sistema de saúde. Um dos elementos-chave da resiliência é a existência de “capacidade de pico”, isto é, os recursos, práticas, políticas e sistemas necessários para acomodar um pico de doentes durante uma crise de saúde pública. A construção de capacidade de pico geralmente exige a acumulação de recursos que não serão completamente utilizados em períodos sem crise, implicando que possam existir tensões entre eficiência e resiliência nos sistemas de saúde.
A incompatibilidade entre eficiência e resiliência dos sistemas de saúde foi comprovada num estudo que estamos a desenvolver, que demonstra uma significativa correlação positiva entre a eficiência dos sistemas de saúde europeus em 2017 e a mortalidade devido a COVID-19, sugerindo que os sistemas de saúde mais eficientes (que utilizavam menos recursos para um dado nível de saúde da população) foram os sistemas menos resilientes durante a pandemia COVID-19.
A demonstração da incompatibilidade entre eficiência e resiliência dos sistemas de saúde coloca os responsáveis pelas políticas públicas perante uma escolha difícil entre estes dois importantes objetivos. As políticas que aumentam a resiliência comprometem a eficiência, ao contribuírem para uma acumulação de recursos no sistema de saúde para além do que seria estritamente necessário em períodos sem crises sanitárias. A canalização de recursos em excesso para o sistema de saúde implica que outras políticas públicas (apoio social, educação, segurança, etc.) sejam privadas de recursos (que não estarão a ser completamente utilizados na saúde). Assim, os apelos das organizações internacionais (como a OCDE), para a necessidade de reforçar a resiliência dos sistemas de saúde devem ser escutados, mas só devem ser seguidos depois de devidamente avaliados os custos de oportunidade que tal reforço implica. Só se o custo de oportunidade dos recursos subutilizados no sistema de saúde nos períodos sem crises sanitárias for inferior aos custos da falta de resiliência do sistema durante os períodos de crise é que deve ser prioritário o reforço da resiliência. Os decisores têm de ponderar se querem um sistema de saúde mais resiliente ou um sistema mais eficiente.
Álvaro Almeida
Professor Associado, Faculdade de Economia da Universidade do Porto